A formação profissional hoje se confunde com a pessoal, pois como qualquer livreto de gestão de pessoas afirma, existe uma barreira cada vez menor entre essas duas instâncias da vida. As corporações e os governos já ganharam nesta batalha silenciosa e pune severamente quem não se enquadra. A revolução digital trás este efeito consigo e quase ninguém te conta.
Internet mais rápida, celular e o resto das coisas híper-eficientes estão cada vez melhores em te fazer trabalhar fora de horário. Responder e-mail e whats-app pro chefinho as 23h. Ser bombardeado por notícias sem importância alguma, que você porém tem que acompanhar, e não receber nada por isso.
Já havia preparado este post a algum tempo mas vou dispará-lo agora, aproveitando que o Executivo Pobre
fez um post legal relatando algumas dificuldades em contratar alguém para uma vaga de estágio. Em resumo é aquela coisa que todo mundo sabe: Essa nova geração de molengas super protegidos simplesmente não tem fibra pra aguentar as porradas do mundo corporativo (que segundo o conceito de antifragilidade te forçam a evoluir) e por outro lado parecem não ter muitas oportunidades justas de crescer através do bom e velho trabalho duro. Não tem emprego de qualidade disponível, não tem grana sobrando, nem contatos e nem mesmo estrutura familiar pra buscar experiências relevantes que te dêem a chance de trabalhar em um simples estágio.
Como falei no post dele, acredito que isso se deve à lei do estágio, que determina que todo estagiário tem de ser remunerado e causa encargos ao empregadores, como férias, décimo terceiro salário e tudo mais. Ou seja, não existe mais estágio, só emprego mesmo.
Isso é como o salário mínimo e o resto das leis trabalhistas, causa desemprego. Uma empresa que antes podia dar estágios de curta duração (eu fiz vários não-remunerados) e entregar experiência corporativa aos novos entrantes do mercado, agora afunila a seleção e forma uma verdadeira casta de super-preparados em relação aos sem nada interessante.
O ser humano é naturalmente um assistidor de netflix profissional e procrastinador, e experiência no "mundo real" corporativo é sim, uma das coisas que te tira dessa letargia mental de adolescente. Responsabilidades, receber dinheiro pelo trabalho, que é pouco, e a natural comparação com os concorrentes a cargos melhores fazem a pessoa crescer. Porque? Porque quase ninguém cresce sem experiência real. Quase ninguém tem outros lugares pra crescer (mesmo a casa) como pessoa além trabalho.
Junte isso a cultura da faculdade, onde todo mundo tem que ter faculdade e tem, e você terá hordas de pessoas despreparadas e desinteressantes para as empresas. Isso não sou eu quem afirma, mas qualquer pesquisa que demonstra que o brasileiro é um dos povos que menos produz por trabalhador em relação aos países desenvolvidos como os USA.
Eu não tenho filhos, mas sei exatamente o que fazer para aumentar as chances de uma pessoa arrumar um bom emprego sem que isso lhe faça abdicar de sua vida pessoal, que é a que mais importa pois acredito que só devemos trabalhar pra gerar valor pra nós mesmos em primeiro lugar - e assim pensava Adam Smith.
1. Trabalhar
1.1 Trabalhar desde cedo
Já contei aqui que queria trabalhar desde garoto, cheguei a pedir emprego como empacotador de mercado (trabalho que desapareceu em razão do aumento do salário mínimo e lei do estágio) mas não pude pois não tinha idade suficiente. Mais tarde meus pais mesmo, erroneamente me proibiram para dar foco nos estudos, pois acreditavam como a maioria na fórmula arcaica e estúpida de que decoreba de teoria = melhores empregos.
Amigos, trabalhar desde cedo é muito importante. Meu avô trabalhou desde os 9 anos e nunca se arrependeu, pelo contrário, só se orgulhava assim como TODAS as outras pessoas que conheci e fizeram parecido. Trabalho escravo, desumano e sem condições mínimas deve ser combatido seja para a idade que for. Proibir jovens de trabalhar sim é desumano, pois a geração de valor para a sociedade e de conhecimento para o indivíduo e de dinheiro no longo prazo para as famílias é absurdo.
Bancas de limonada são um símbolo de como o americano
aprende desde cedo a ser prático, gerar valor e lucro.
1.2 Pagar por serviços e cobrar responsabilidades na casa
Como fazer isso sendo que no Brasil é proibido? Fazendo trabalhar na sua própria empresa ou na de algum amigo, ou no mínimo pagando para executar certos trabalhos como cortar grama, reparar a casa, limpar, etc. Sim, sou partidário de que tudo na vida é visto pelo ser humano como uma relação de punição/satisfação, desde o levantar da cama de manhã até ir dormir à noite. Muitas pessoas acreditam que negociar dinheiro com os filhos não é bom, sabem porque? Porque no fundo acreditam que vão perder o controle e ter que negociar por tudo. O caso é simples. Os filhos devem receber por seu trabalho sem esquecer que uma das cláusulas do "contrato" é que ele mora e come em sua casa e tudo isso é pago por alguém.
Tenho diversos exemplos de como isso funciona. Os colegas de escola mais maduros em relação à finanças e conhecimento do mundo real que tive durante a escola foram os que tinham que ajudar na loja ou mercadinho dos pais. O resto, incluindo eu, não aproveitava o tempo de modo útil e sim gastando tempo procurando mais e mais tempo livre e procrastinando os estudos escolares (que não te ajudam em nada pra ganhar dinheiro).
Temos na nossa cultura o pensamento ridículo que trabalhar é coisa de pobre, é só ver esses caras usando na blogosfera termos como "subemprego". Quase todo mundo pensa que emprego bom de verdade vai vir
após finalizar uma faculdade, e ser garçom ou vendedor de loja é algo muito baixo. Essa visão é completamente enganosa e só mantém as pessoas pobres.
Cada vez menos os jovens tem capacidade de aprender
a trabalhar em razão das leis.
1.3 Trabalhar pra aprender, nem que seja de graça
Alguma coisa a pessoa deve fazer. Nem que seja trabalhar de graça por uns dias pra
aprender alguma coisa nova e poder rechear o currículo nas etapas iniciais. Gostaria que meus pais tivessem pedido para algum conhecido pra eu aprender a vender atrás de um balcão ou auxiliado em algum almoxarifado, varrendo a calçada, sei lá. Alguma coisa dá pra fazer.
Se um jovem bater em 100 empresas dizer: "Boa tarde, posso lhe ajudar em qualquer trabalho durante uma semana pra aprender algumas coisas úteis? Não tenho experiência nenhuma pra por no currículo e me interesso em trabalhar no seu ramo no futuro". Tenho certeza alguma coisa arruma. Ainda agradece ao patrão a "oportunidade de aprendizado profissional" e pede uma carta de recomendação,
que vai ser útil. Aqui em Portugal e no resto da Europa se costuma pedir, até exigir em alguns casos carta de recomendação.
Certa vez pedi para uma professora de faculdade me ajudar a achar um estágio, "
mesmo que sem pagamento", ela falou com uns conhecidos e me arrumou uma entrevista. Ela estava certa quando falou em aula que mesmo uma oportunidade de
um dia de vivência numa empresa de nosso ramo valia a pena, e ela estava coberta de razão pois em um dia trabalhando aprendia mais do que em tudo o que vi na faculdade.
2. Cursos e atividades extra
O "extra" aqui é dito assim somente porque a escola é vista na nossa sociedade como algo principal na vida jovem de uma pessoa. Culpa dos marxistas que buscam substituir os valores familiares pelos estatais e vem desde Lutero que deu um jeito de tornar a escola pública obrigatória, convencendo o rei que assim ia ensinar baboseiras estatais e criar melhores cidadãos e soldados.
Ruim ou boa ela é obrigatória até certa idade. Ou você matricula seu filho em uma instituição que segue o currículo aprovado pelos burocratas que sabem tudo mas nunca abriram uma empresa (e se abrissem quebrariam, vide a Wanda Rousseff e suas lojas de 1,99) ou vai pra cadeia e perde a guarda dos seus filhos.
Assim, se for possível no futuro o ideal é o Home-school, ou seja, ensinar seus filhos desde sua própria casa, tendo maior controle do conteúdo e evitando assim contaminação com o que há de pior culturalmente e também protegendo a integridade física e mental de seus filhos. Onde eu estudei presenciei coisas que não deveriam ocorrer nem em presídio, como caras que levaram facas e armas de fogo, e drogas pro ambiente escolar.
Se a única opção for matricular seu filho numa escola, que seja pública. Sim, pública pois em primeiro lugar você já financia ela com impostos, e com o preço das escola particular você poderia prover atividades bem mais interessantes que estas provêm por um valor bem mais alto, tais como:
Artes marciais - geralmente propagam valores interessantes em suas filosofias, além de ter a questão da saúde, autodefesa e superação de dificuldades. De preferência em um lugar onde exista competição (mas sem medalha pro perdedor) e treino duro. Pessoalmente nunca vi alguém aprender a defender o nariz e desenvolver equilíbrio sem ter levado soco no rosto ou uma queda, mas ai vai de cada um.
Natação - Aprender a nadar é importante na vida e acredito que devamos ter conhecimentos mínimos para "enfrentar o mundo". Ter contato com a água desde cedo desenvolve a saúde e as pessoas que conheci que não sabiam nadar não sei por qual motivo eram menos seguras de si.
Aulas de música (de preferência canto e guitarra) - Desenvolvem muito a criatividade, lado artístico e desinibição. Quem faz apenas algumas aulas de canto já canta bem pro resto da vida e desenvolve as bases pra se expressar melhor.
Escotismo - Eu não gosto de escotismo pois os escoteiros que conheci não pareciam ter aprendido nada útil. Acho que escotismo surgiu pra dar vivência ao ar livre e ensinar coisas úteis que a partir de determinada época só são aprendidas por soldados. Mas o escotismo de hoje em dia parece ter um ambiente super-protegido onde se acampa dentro de salões de festas, e ao invés estudar ancoragem para atravessar um rio atravessam piscina de bolinhas e promovem gincanas aos olhos de supervisores fora-de-forma, mas isto é apenas minha impressão. Pode, mesmo assim, ser uma atividade onde crianças tímidas possam fazer amigos e com isso aprender a se relacionar melhor.
Aulas de xadrez - Tenho a impressão que o "jogo dos reis" deixa a pessoa mais inteligente e entrega uma espécie de conhecimento comum entre os engenheiros, que é executar atividades através de um processo. Lembro que quando bem jovem, nos anos 80 e 90 meu pai convidava amigos pra jogar xadrez e conversar. Acredito que isso se perdeu ao mesmo tempo em que as relações se tornam cada vez mais vazias e o mundo burro. Poker também é interessante mas na nossa cultura jovens não jogam isso.
Línguas - Inglês "avançado" é obrigatório ser fluente e uma terceira língua é cada vez mais desejável. Se começar cedo, aprende mais rápido (ou seja se gasta menos). Youtube, Duolingo e um monte de maneiras pra ajudar que antes não existiam agora existem. No "meu tempo" aprendíamos bastante através de músicas, vídeo-game, filmes legendados e curso presencial. Hoje em dia se você aprende assim seu inglês fica um pouco ridículo.
Cursos de utilidades - Antigamente as pessoas faziam cursos de datilografia. Mais tarde de computação, e hoje como quase todo mundo tem computador desde cedo isso caiu em desuso. Os estudos mais úteis que uma pessoa pode fazer desde jovem são os de eletricidade, construção, encanamento e coisas que te tornem menos dependente de chamar alguém pra fazer por você. A internet até ajuda mas não deve ser vista como uma muleta pois pra aprender esse tipo de coisa é necessária alguma prática. Possuir algumas ferramentas em casa também é altamente recomendado.
Conheci vários brasileiros e outros estrangeiros que aqui em Portugal trabalham com essas coisas por vários motivos, mas principalmente porque é uma coisa que as pessoas sempre vão dar valor, não é todo mundo que sabe, e não é tão qualificado a ponto de ser difícil de exercer em qualquer parte do mundo.
3. Curso técnico durante o "segundo grau".
Me arrependo profundamente de não ter feito curso técnico de administração ou contabilidade durante o segundo grau. Na minha cidade existia uma escola onde podia se fazer isso, e acredito que em qualquer cidade maior do Brasil isto seja plenamente possível. Tinha também uns técnicos industriais mas estes não me interessam. Noções de Administração e Contabilidade vão te ajudar em qualquer profissão que escolha seguir mais tarde, além de abrir portas pra trabalhar em qualquer empresa como auxiliar ou analista caso não existam vagas pra sua profissão de formação superior (caso tenha).
4. Cursar uma faculdade
Se você não for muito rico como o Eike Batista (até pra ele a faculdade está fazendo falta agora) e herdeiro de uma empresa, é bem provável que lhe exijam diploma universitário em alguns momentos da vida. Em uma empresa que trabalhei, o patrão se recusava a dar aumento a uma gerente enquanto ela não terminasse a faculdade, pois já tinha estagiários formados. Não sei se isso é certo ou errado, mas é um exemplo do que pode acontecer. Muita gente nem sequer é promovida por não ter curso superior, e aliás muitos nem arrumam emprego pois diversas profissões ele é obrigatório.
Aqui dou umas dicas sobre qual curso escolher baseado na minha opinião, mas isso vai de cada um. A questão aqui é que, se possível for, curse à distância pois o conhecimento ensinado nas instituições quase não tem a ver com o mundo real, além de que cursos à distância são mais baratos e você (u seu filho) terá mais tempo livre.
Quanto ao custeio do curso, pretendo pagar:
1. Se eu tiver condições;
2. Se o curso for Engenharia Civil ou Medicina;
3. No caso da Engenharia, que trabalhe pra pagar suas outras contas. Não vai receber mais nem um centavo além do curso. Se morar em minha casa vai poder poupar mais, mas a escolha será dele.
Caso opte por algum curso fora de minha lista, minha ajuda será através de prover casa, comida, etc, com contraponto de que ele/ela trabalhe para pagar a faculdade e ajudar nas contas da casa. Isto não é uma punição e acredito estar ajudando seu desenvolvimento desta maneira.
Sinceramente, a chance de eu ter que lhe ajudar a pagar as contas escolhendo outras profissões é bem maior, então que o dinheiro venha do rendimento do que eu teria pago por este outro curso universitário.
5. Servir ao Exército
De longe meus dois posts mais acessados, talvez pelo motivo do jovem adulto ser obrigado a se apresentar com 18 anos sem ter conhecimento algum do que esperar caso das Forças Armadas lhe requisitarem (leia
aqui e
aqui - estão um pouco desatualizados e podem não refletir 100% a realidade do militar). No Exército você vai aprender coisas úteis pra caramba, se tornar adulto de verdade pronto pra encarar o início da vida profissional numa empresa.
Chamo a atenção que mesmo lá dentro tem coisas mais úteis pro seu futuro fora da Força que outras. Algumas dependem de escolha suas, outras não.
Em certa empresa que trabalhei, o dono só contratava três tipos de pessoas: Mulheres bonitas, pessoas indicadas (foi meu caso), e ex-militares. Meu cargo não tinha nada a ver com RH e mesmo assim eu era responsável pela recepção de currículos, que infelizmente iam todos para o lixo.
Para o tipo de empresa que ele tinha isso funcionava muito bem. De qualquer modo o ex-militar se encaixava lá por ser disciplinado e estar acostumado com trabalho duro e receber "mijadas". Ele disse em uma reunião que preferia contratar militares porque, diferente de gente com pouca experiência mas um currículo melhor, o turnover era bem mais baixo e o ambiente era mais "seguro e estável" (ele também havia sido militar), além de não precisar "pegar pela mão" e ensinar o básico do básico, como usar o horário de trabalho para trabalhar. Ou seja, todos tinham praticamente as qualidades opostas à "geração atual" citada no post do nosso amigo Executivo Pobre.
Em última instância, tendo a oportunidade de servir ao EB já vai ter sido um (talvez primeiro) trabalho, e por isso caso tenha filhos vou pedir formalmente no quartel pra que ele sirva no caso de ser homem.
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Fora tudo isso, existem vários valores que devem ser exercitados em casa e outras atitudes que pode-se ter visando uma vida produtiva e satisfatória para os filhos, como por exemplo, ensinar a poupar e investir, mas disso vamos tratando em outros posts. Também me concentrei na formação pra "empregado", uma vez que formar um "empreendedor" demanda mais discussão.
E aí, gostou? Não gostou? Não esqueça que isso tudo são apenas opiniões. Dá pra ver que, para simplesmente preparar um filho para vida profissional vai grana pra caramba, então enquanto eu não for rico vou protelar o quanto puder, e se possível mais ainda.
O próximo post será uma curta parte final deste, com foco em duas coisas simples que devem ser observadas durante a formação.